Já falamos aqui da análise da necessidade de atender parâmetros de acessibilidade em edificações privadas de uso coletivo, sejam comerciais e/ou industriais.
Também comentamos no mesmo artigo intitulado O que é preciso para tornar edificações comerciais e industriais acessíveis? sobre a necessidade ou não de regularizar a acessibilidade em edificações existentes.
Agora vamos abordar a temática da acessibilidade para edificações multifamiliares, com foco nas providências que devem ser tomadas pelos incorporadores, construtores e também síndicos.
O que fala o Estatuto da Pessoa com Deficiência
O artigo 57 da Lei 13.146 conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência já tratava desta questão da adaptação das edificações públicas e privadas de uso coletivo, que tiveram que se adaptar para atender as normas de acessibilidade.
Também em relação às construções novas a exigência é de projeto e execução de edificações acessíveis.
Em relação às edificações multifamiliares, o texto não falava como deveria acontecer esta acessibilidade, já que não trata-se neste caso de permitir acesso sem barreira a todos, pois estamos falando de edificações privadas e de uso privado.
De modo simplificado, as exigências eram:
- Ter um número mínimo de unidades autônomas acessíveis;
- Não ter diferença de valores entre unidades comuns e unidades acessíveis.
Projetos em aprovação e construções em andamento não teriam que se adequar à esta Lei(2015).
Conforme artigo 58:
O projeto e a construção de edificação de uso privado multifamiliar devem atender aos preceitos de acessibilidade, na forma regulamentar.
Este Regulamento foi agora estipulado e é o tema do recente Decreto 9451, de 26 de julho de 2018.
Decreto 9451
O decreto 9451 sancionado em 26 de julho de 2018, clareia bem mais esta questão e elucida itens que antes não eram exigidos.
As novas exigências apresentam um desafio aos empreendimentos residenciais novos pois toda unidade autônoma deve ser flexível e adaptável de forma a atender os requisitos de acessibilidade. A opção de ser acessível ou não fica a critério do futuro proprietário, no momento da compra.
Não temos mais que atender um percentual mínimo de unidades adaptadas, com exceção para edificações com sistema construtivo que não permita alterações posteriores (art. 6º). A exigência é oferecer unidades que possam ser adaptadas para garantir a acessibilidade, a critério do comprador caso a mesma não cumpra os requisitos mínimos na planta pavimento tipo.
Mantém a questão de não ter valores diferenciados para um imóvel adaptado e outro sem as adaptações para torná-lo acessível, e cabe agora ao incorporador trabalhar os custos de forma a viabilizar as alterações necessárias.
O construtor deverá tomar as providências para a adaptação da unidade internamente e deverá entregá-la da forma como solicitado pelo comprador, com todos os itens opcionais solicitados conforme disposto nos anexos deste decreto.
Estes anexos incluem itens para adaptação que impactam em layout e consequente alteração na dimensão de alguns ambientes e de todo o partido arquitetônico da unidade e ainda itens para uma adaptação intitulada razoável, com ajustes a serem feitos de forma a permitir acessibilidade por pessoas com deficiência auditiva, visual, intelectual ou nanismo.
Áreas Comuns
As áreas comuns devem ser totalmente acessíveis, conforme artigo 7º abaixo: As áreas de uso comum das edificações de uso privado multifamiliar deverão ser acessíveis e atender aos requisitos estabelecidos nas normas técnicas de acessibilidade vigentes.
Mas ainda persiste a dúvida em relação aos condomínios existentes que não possuem acessibilidade. Diferente do que ocorre com as edificações privadas de uso comum, onde é clara a exigência de adaptação às normas de acessibilidade segundo o Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Fica a dúvida, e quem puder compartilhar comigo sua opinião será muito oportuno: Quando uma pessoa com deficiência adquire um imóvel em uma edificação cujas áreas comuns não possuem acessibilidade, é direito desta a exigência de adaptação do condomínio, mesmo este tendo sido aprovado anteriormente a este decreto?
Análise dos Itens Adaptáveis
Para adaptação das unidades o decreto lista vários itens que descrevem características para deixar a unidade acessível. Analisamos item a item e temos no Anexo I aqueles que afetam características construtivas e layout, necessitando uma flexibilização de projeto que impacta bastante na adaptação da unidade e no Anexo II itens que podem ser alterados sem impactar significativamente nos custos para adaptação da mesma. Abaixo itens que impactam no projeto e que os arquitetos, incorporadores e construtores devem ter uma atenção especial. Talvez a melhor solução seja já atender os mesmos em todas as unidades, evitando o impacto da adaptação. Também é possível prever plantas inteligentes, onde devido à necessidade de adaptação, ambientes sejam alterados, mantendo o partido, mas já oferecendo solução acessível. Estes itens são:
- Vão livre de passagem das portas;
- Largura mínima dos corredores;
- Alcance visual adequado de janelas e guarda-corpos;
- Área de manobra no quarto para transferência lateral à cama, o que implica em aumento deste ambiente;
- Todas as adequações necessárias para tornar um banheiro acessível, o que implica necessariamente em aumento da área útil do mesmo;
- Todas as adequações necessárias para tornar uma cozinha acessível, com área de manobra com aproximação lateral para fogão e geladeira além da altura correta da bancada da pia e torneira.
Agora citaremos os itens referentes a adaptações pontuais, conforme Anexo II:
- Tratamento de desníveis no piso no acesso à unidade autônoma e em seu interior, incluídos terraços e varandas;
- Faixa de altura dos dispositivos de comando e equipamentos de comunicação com sinal sonoro e luminoso;
- Portas com maçaneta tipo alavanca;
- Instalações de interruptores e equipamentos com altura adequada ao uso por pessoa com nanismo.
Apesar destes últimos serem itens de mais fácil aplicação, temos mudança nos projetos de instalações, e nestes casos não é possível atender estes itens em todas as unidades, pois alturas confortáveis para pessoas portadoras de deficiência e nanismo, por exemplo, não atendem pessoas que não possuem estas necessidades.
Data de início
A vigência do decreto e portanto exigência das medidas solicitadas no mesmo será a partir de janeiro de 2020 (18 meses após sua publicação), data limite para protocolo de projetos para aprovação sem atender aos requisitos acima expostos. Portanto devemos ter em mente que garantir acessibilidade é uma questão de respeito e não trata-se apenas de pessoas com algum tipo de deficiência motora. Com o envelhecimento da população brasileira a necessidade por espaços acessíveis aumenta a cada dia e em nossas próprias vivências podemos observar algum fato onde sentimos esta necessidade para um parente idoso próximo ou até para nós mesmos, enfrentando temporariamente algum problema físico.